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Data: Domingo, 24 de novembro de 2013
Dionísio Carneiro, um formador de economistas
25/11/2013
RIO - Um formador de jovens economistas. O subtítulo do livro sobre o professor da PUC-Rio, Dionisio Dias Carneiro, morto em 2010, mostra a faceta mais marcante do pesquisador que, juntamente com Francisco Lopes e Rogério Werneck Vianna, criou o Departamento de Economia da PUC. "Dionisio Dias Carneiro, um humanista cético" começou a ser gestado há três anos por um dos melhores amigos, decano da PUC-Rio, o economista Luiz Roberto Cunha. Nesta segunda-feira, haverá uma homenagem na universidade, onde ele ficou por mais de 30 anos, quando o livro será lançado.

-Tivemos os relatos dos amigos e colegas das instituições que Dionisio ajudou a criar na UnB, na FGV, na PUC-Rio e na Casa das Garças, lugares onde ele desenvolveu sua paixão de ensinar e pesquisar - conta Luiz Roberto Cunha, que classifica o livro sobre o amigo, como "muito emocional". A característica de formação aparece nos mais de 40 depoimentos de ex-alunos que responderam ao pedido de Cunha para escrever.

- A resposta foi incrível. Dedicamos um capítulo inteiro somente a essas manifestações.

Monica Baumgarten de Bolle, filha do economista Alfredo Baumgarten, outro velho amigo de Carneiro e Cunha, morto em 1989, explica o motivo desse encantamento:

- Tratava os alunos como iguais, adorava ensinar. E tinha uma capacidade impar de enxergar os talentos - lembra a economista que herdou a Galanto Consultoria, uma espécie de extensão para os estudantes de economia da PUC.

Com a parceria de Maria Antonieta Leopoldi e Eduardo Raposo, Cunha organizou o livro que conta, além da trajetória de Carneiro pelas universidades, a única e breve passagem no poder público, como vice-presidente da Finep entre 1979 e 1980, apesar de "ser muito convidado (para o governo), sempre se recusou", lembra Francisco Lopes, ex-presidente do Banco Central e amigo deste do tempo da graduação, completando: "sabiamente eu diria".

- Ele foi parceiro de sempre, uma alma gêmea.

Depois do doutorado em Vanderbilt, em Nashville, Estados Unidos, Carneiro passou pela UnB, a convite de Edmar Bacha que assina o prefácio do livro. Como a experiência de criar a "Cambridge do Planalto" não dera certo, Carneiro vai para FGV, a convite de Simonsen, que logo depois vai para o governo. Na época, Carlos Langoni ficou na direção da EPGE, vindo da universidade de Chicago, com perfil mais liberal, enquanto Lopes e Dionisio, com influência keynesiana. Eles acabaram saindo, juntamente com Rogério Werneck. Para isso, aceitaram uma redução de 30% do salário e assumiram o desafio de formar a pós-graduação da PUC. Pedro Malan se juntou ao grupo, depois veio André Lara Resende, que foi aluno de Dionisio da FGV. Ele lembra de como os problemas de saúde — Dionisio tinha hepatite C — acabaram tornando-o mais aberto:

- O Dionisio, que era excessivamente racional, ficou uma pessoa mais emotiva, mais agradável, sem que isso nunca tenha atrapalhado a racionalidade, a organização dele. Mas ficou uma pessoa de convívio mais fácil.

Logo depois vieram Edmar Bacha, Eduardo Modiano e Persio Arida. As discussões iniciadas lá resultaram no Plano Real.

- E a PUC tinha esse jeito (dessa aproximação da política econômica com a academia). Hoje está mais separado. A universidade, a academia no Brasil está mais próxima do padrão internacional, com publicações no exterior.

Em um depoimento de 65 páginas, Lopes conta essa história, pela visão de um economista.

- Esse trabalho de criação dos planos de estabilização que finalmente deu certo com o Real foi muito relatado por jornalistas. Nesse processo, foi intensa a participação de Dionisio.

A época era de inflação alta e temor de hiperinflação. As discussões acadêmicas em torno da maneira de enfrentar a alta dos preços frequentavam os bancos da Escola de Pós-graduação de Economia da Fundação Getulio Vargas, onde vivia Mario Henrique Simonsen. Esses economistas estavam lá quando se discutia se o combate à inflação aconteceria de forma gradual, como defendia Simonsen, ou por um choque heterodoxo.

- O que eu chamo a atenção no artigo, ainda na fundação (Fundação Getulio Vargas), é que Simonsen fazia o controle de preços. O próprio Simonsen, que defendia o modelo gradualista, achava que o modelo realimentava a inflação, que tendia a se reproduzir. Mudar o regime foi um avanço importante.

O choque heterodoxo aconteceu com o Plano Cruzado, que, na opinião do economista nasceu morto, com a inclusão do gatilho salarial, que poderia rapidamente reindexar a economia. Nesse hora, Lopes se pergunta por que economistas como André Lara Resende e Pérsio Arida, principais articuladores do plano, afastaram-se tanto das ideias iniciais concebidas ainda na PUC. Também se culpa por ter participado, embora no fim do processo, à equipe do Plano, juntamente com Eduardo Modiano.

“A resposta é que é indescritível a explosão de autoestima, no sentido kohutiano do termo, que pode ser experimentada por um economista acadêmico ao ver suas ideias teóricas se transformarem em decisões importantes de governo e isso o torna particularmente vulnerável a todo o tipo de imposição política”, diz Lopes no livro.

- Uma tentação de ver tudo o que está sendo feito. Sensação muito especial. A experiência de fazer um plano muda a vida da gente. No início foi um sucesso muito grande. Houve episódios de estar na rua e ser cumprimentado. Quando deu errado, xingavam a gente na rua. O gatilho permitiu a indexação. Se não se quebra a indexação, não se estabiliza. Foi o entendimento que a gente desenvolveu, num país de inflação crônica. No esboço do André (Lara Resende) não tinha gatilho salarial, que foi o grande problema do Cruzado. Difícil entender como aparece o gatilho no plano.

A segunda tentativa de estabilização, no Plano Bresser em 1987, afastou os dois amigos, Lopes e Carneiro. Dionisio não entendia o motivo de Lopes entrar na experiência e fez críticas públicas ao plano. "A relação entre Dionisio e Francisco passou nesse período por um de seus piores momentos, com Francisco se sentindo injustamente criticado pelo amigo.", diz Lopes no artigo.l

O Real deu certo quase 30 anos depois das primeiras discussões sobre gradualismo e choque heterodoxo. Passou pelo teste da troca de governo e do sistema cambial.

Mas, na opinião de Carneiro, “a estabilização seria uma tarefa que não terminaria nunca. Nos seus artigos na imprensa, com sua característica combinação de rigor e ternura, estava o tempo todo apontando eventuais inconsistências na política econômica, e reclamando dos governantes do dia sobre qualquer complacência ou desvio em relação à postura séria que considerava a única garantia da estabilidade”, finaliza assim Francisco Lopes seu depoimento sobre o amigo e os planos de estabilização.

O último centro de pensamento criado por Carneiro foi a Casa das Garças. Como berço de economistas ligados aos planos e aos governos que o implementaram, a casa chegou a ser chamada de ninho de tucanos:

- Ele detestava esse título. Não era o que pretendia ali. Poderia se perder a isenção do pensamento - lembra Monica, que escreveu a orelha do livro com amor de uma filha: “Para todos aqueles que desfrutaram do convívio com Dionisio, este livro é um presente. Uma forma de continuar dialogando e aprendendo com ele.”

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