Jornal do Brasil Site: Jornal do Brasil
Data: Quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Hora: 18H29
Seção: País
Autor: Maria Clara Bingemer
Fonte: ___
Fotos: ___
Artigo - Cadu!!!
12/01/2012
Sempre fui contra os preconceitos machistas dos homens que esperavam ansiosamente um filho para dar início à prole e olhavam com ar decepcionado a menina primogênita. São fonte permanente de horror para mim as histórias de civilizações e culturas que não recebem os bebês do sexo feminino, eliminando-os antes do nascimento. Provoca-me desconforto interior o brinde italiano que sintetiza de forma perfeita o machismo latino e mediterrâneo: "Saluti e figli maschi!"

Minha primeira filha é mulher, e com ela aprendi a ser mãe e muitas mais coisas. Deu-me uma neta, a primeira, que me ensinou a ser avó e que amo com ternura imensa. Minha terceira filha é menina, e minha segunda neta idem, sendo as duas fontes de orgulho e ternura em minha vida. Família de seis Marias — Maria Clara, a mãe; Maria Laura e Maria Cândida, as filhas; Maria Isabel, a nora; Maria Carolina e Maria Antonia, as netas — a cultura feminina é um fato em nosso clã, onde voam plumas e purpurinas, e predomina a cor rosa. E onde Ekke, o pai, e Carlos Frederico, o filho, estão em evidente minoria.

Como explicar, portanto, como entender sobretudo, os sentimentos tão inusitados e fortes que vivi no último sábado quando nasceu meu primeiro neto, Carlos Eduardo? Olhei-o, e foi como uma torrente de doçura e sintonia que dentro de mim se derramava. E tive a certeza de que aquele menininho tinha desde aquele primeiro olhar um lugar de honra em minha vida.

Saboreando a alegria do nascimento de Cadu, perguntei-me: por que o amor é tão grande quanto já foi antes em outras ocasiões, mas ao mesmo tempo único e diferente? Por que sinto que o amo tanto e com originalidade tão total, sentindo que ele não se sobrepõe a ninguém e apenas soma e multiplica, sem nunca diminuir nem dividir? Por que esse serzinho tão pequeno e frágil, que apenas deseja os braços e o seio de sua mãe, tem tal poder sobre o meu coração, sem um laivo de totalitarismo e imposição, mas apenas sendo o que é: um bebê recém-nascido, filho de meu filho?

Cadu nasceu na véspera da festa da Epifania, quando a Igreja celebra outro recém-nascido. Dele se disse ser a luz das nações. Aquele Menino foi a revelação definitiva e total de Deus a toda a humanidade, mostrando o segredo de seu mistério: salvação e paz, justiça e redenção. Para todos, para todas. Às vésperas da epifania de Jesus, Cadu era nossa epifania. Família, amigos, todos se debruçavam sobre seu pequeno rosto, apreciando-lhe os traços delicados e a pele cor de rosa.

Ele nos revelava e continua a fazê-lo — quem somos e o que somos chamados a ser. Revela-nos que na Epifania maior que celebrávamos e da qual sua pequena e particular epifania era um luminoso sinal, o amor divino derramava-se sem economia sobre um mundo tão sedento e tão conflitivo. O rostinho de Cadu, adormecido no aconchego dos braços de sua mãe, era em si mesmo uma revelação: somos seres transcendentes e habitados pelo Espírito divino. Em nossas narinas é soprado o vento santo que nos recria constantemente, fazendo-nos sempre de novo inocentes e puros como essa criança.

Como avó enamorada e feliz, minha meditação junto ao berço de Cadu foi um desfiar de desejos para sua vida que apenas se inicia. Desejei que seja bom e justo, atento aos pobres e infelizes, doce e cordial com todos e, sobretudo, com as mulheres. Desejei intensamente que não se conforme com este mundo, e se comprometa na sua transformação. Que lute, se empenhe, trabalhe para isso.

Que brinque, corra, faça travessuras e rale o joelho, chore, ria, se alegre muito, intensamente... Mas que no avesso da brincadeira leve a sério o que é para ser levado, louvando o que bem merece: a força do homem, a beleza da mulher, a generosidade da Criação; respeitando tudo que vive, se move e existe, mesmo frágil, indefeso e ameaçado; servindo com alegria aos outros: anciãos, crianças, adultos, todos, sobretudo, aos mais necessitados.

Diante de Cadu recém-nascido, compreendi como são estéreis e carentes de consistência os comentários machistas que exaltam os exemplares masculinos da humanidade. Pois o que é o homem sem a mulher? E, por outro lado, o que somos nós mulheres, sem a diferença do homem? A partir de agora, nossa família não encontra identidade sem Cadu. Mas não porque seja menino, homem, macho. E sim por ser Cadu, único e irrepetível; obra-prima do Criador, cuja forma foi quebrada e nunca mais poderá ser repetida; homem que, se Deus quiser, saberá e praticará a verdade consoladora de que "em Cristo não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, mas todos são um só''. Obrigada, Cadu querido!

* Maria Clara Bingemer, teóloga e professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio, é autora de 'Deus amor — Graça que habita em nós' (Editora Paulinas), entre outros livros.


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