Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: WEB

Data: 19/01/2016

Veículo: Portal Fator Brasil

Tráfico de drogas, especialmente no Rio de Janeiro
19/01/2016

O narcotráfico cresceu muito nos anos ’80/90 e hoje pode-se falar em uma cifra anual superior a US$ 500 bilhões, cerca de 10% do comércio internacional. É de se notar – por ser absolutamente fundamental para qualquer politica séria de controle do narcotráfico – a brutal disparidade de preços e valores entre o custo da matéria prima, a droga levada ao ponto de produto final e em suas fases posteriores de distribuição para o consumo, onde não raro, as partidas são batizadas, misturando-se ao produto original pó de mármore, farinha, base de talco, etc. Data do crescimento vertiginoso do narcotráfico na década de ’80 a profecia de que o Brasil viria a se tornar o maior fornecedor de cocaína do mundo, o maior corredor do narcotráfico. As razões eram todas racionais e podem ser sintetizadas: as fronteiras brasileiras são extensíssimas, guardam relação, em parte, com a dos países tradicionalmente produtores e ainda são grandemente desguarnecidas; a riqueza nacional é pessimamente distribuída, havendo imensos bolsões de pobreza extrema no interior, especialmente na Amazônia, no centro-oeste e mesmo em determinadas regiões de estados importantes, como o noroeste de Minas Gerais, Bahia etc., para não falar nas populações das fronteiras; a concentração de renda criou uma classe média , média alta e alta com capacidade de adquirir as drogas em caráter permanente e para os de baixa renda, instituiu-se a droga menos pura e outros tipos, naturalmente de baixo custo; facilidade extrema de transposição das fronteiras nacionais, já por sua extensão, já pela fiscalização deficiente e esquemas endêmicos de corrupção.

Os problemas do narcotráfico são geralmente enfrentados e resolvidos à medida em que surgem e ganham uma dimensão incômoda, como foi o caso do mega traficante Fernandinho Beira-Mar e seu tremendo poder, apenas revelado, e possivelmente apenas em parte, quando de sua prisão.

Na década de ’80 dá-se uma mudança que vem a ser essencial para a escalada da criminalidade nos morros e, especialmente, para a mudança qualitativa dessa delinqüência. Trata-se, em verdade, de uma sinistra simbiose: a delinqüência do asfalto forma os seus quistos nos morros, organiza-se, e, ao mesmo tempo, a politica do governo do estado da época, de não permitir que a polícia subisse os morros, preservando redutos eleitorais, são o germe para a implantação sólida do mercado do narcotráfico, a formação de gangues muito mais poderosas, bem armadas, bem articuladas, herdando, de certa forma, o espólio de segmentos do cartel colombiano, sistematicamente combatido pelo DEÃ americano.

Os anos ’90 assistem à institucionalização dessa nova ordem, os traficantes se organizam de modo quase empresarial, ocupam politicamente as favelas, fazem benefícios, “ajudas” à população carente, ocupando espaços deixados pelo vácuo da ausência da ação estatal. Dá-se a estruturação de poder da nova ordem, ignorando quase absolutamente o poder público, mais preocupados se mostrando os “novos donos do poder”, com suas lutas internas por territórios e pontos de venda mais importantes. A população pobre sucumbe ao jugo do narcotráfico e os que podem abandonam as favelas em busca de segurança e de uma vida mais previsível. Os que ficam, adaptam-se, servem e, mais do que tudo, fazem “voto de silêncio” sobre tudo que se passa à sua volta; é a maneira de sobreviver em tal meio. O rendoso negócio do narcotráfico transborda dos morros e se espalha por outros estados e o volume de dinheiro assim obtido passa a ser aplicado em negócios de fachada, para ser lavado. A estruturação das gangues torna-se rígida, consegue aliciar ex-militares para receber treinamento, recebem equipamento, armas e munição muitíssimo superiores e mais modernos do que aqueles usados pelas tíbias forças de repressão.

Acompanha-se, correntemente, o assassinato de policiais civis e militares, e até de promotores e juízes, em um claro lembrete dos chefes do narcotráfico de que se nem mesmo as autoridades oficiais estão imunes, que dizer do cidadão comum. Aliás, cidadãos comuns morrem, de modo igual, em suas casas ou nas ruas e avenidas, atingidos por balas perdidas, fruto da guerra entre quadrilhas.

A hierarquia do narcotráfico nas favelas é organizada de maneira sabida, conhecida, seja das autoridades, seja dos pesquisadores e da população em geral. Existe a cúpula de liderança, representada muitas vezes por um só nome, de grande expressão no crime, com relação com os grandes centros de fornecimento, nacionais e estrangeiros, que não raro, mantêm tentáculos diretos em favelas de maior expressão 10 econômica. Temos a boca-de-fumo, onde os traficantes, com expressivas quantidades, repassam a droga a distribuidores menores; raramente a vendem diretamente, pois, por segurança, preferem fazer a entrega através das esticas, ou seja, pequenos pontos avançados de fornecimento da boca-de-fumo, geralmente próximos ao asfalto, de mais fácil acesso aos compradores consumidores.

Neste quadro, se tem, lastimavelmente, a submissão da população honesta aos interesses dos traficantes e de seu negócio; a gente honesta, diante da barbárie representada pelo narcotráfico e pelos crimes que o rodeiam, roubos de automóveis, extorsões, extorsões mediante seqüestro, tiroteios em estradas, ruas e até em supervias, arrombamento de residências, ataques a repartições do governo, confina-se, protege-se em suas modernas cavernas, ou seja, temem sair de casa, temem comprar um automóvel que chame alguma atenção, temem vestir-se um pouco melhor, temem portar uma câmera, um telefone celular e até um simples relógio. Os homens de bem, não os meliantes, são os confinados, diante da violência malsã. Como já se disse alhures, “no Rio de Janeiro de hoje, estamos todos confinados. Confinados os que são obrigados a viver em apartamentos de janelas blindadas, em prédios de portarias gradeadas e em condomínios que apelam para as empresas privadas de segurança.Confinados os trabalhadores habitantes de morros e favelas a quem os traficantes impuseram primeiro o código do silêncio, e agora o toque de recolher. Confinados estão os credos religiosos e as entidades assistenciais, forçados a ceder seus espaços para o narcotráfico e as quadrilhas”. Confinadas estão, também, as escolas nos vários bairros da cidade, algumas havendo cessado as suas atividades e outras mais estando a providenciar a sua mudança para local mais seguro.

A liberdade de ir e vir é tolhida pelos ditames de quem tem a força das armas e nisso também se incluem as reações dos organismos de segurança pública, evidentemente despreparados; para a ação repressiva inteligente, seletiva e democrática. Sem contar com o papel do Estado, cuja orientação historicamente excludente não consegue dar respostas a problemas sociais de magnitude espantosa”.

. Por: Joao Mestieri, Advogado, especialista em Direito Penal / Criminal - Professor da Puc /RJ - Direito Penal, Direito Processual Penal, Criminologia e Sociologia do Direito. 


Mais sobre Portal Fator Brasil
Tipo de Clipping: Web Data: 28/06/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 26/06/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 18/06/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 15/06/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 13/06/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 06/06/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 31/05/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 29/05/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 28/05/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 24/05/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 21/05/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Tipo de Clipping: Web Data: 16/05/2019Veículo: Portal Fator Brasil

Telefones:
(21) 3527-1140 e (21) 99479-1447 | Ramais: 2252, 2245, 2270 e 2246
E-mail:
imprensa.comunicar@puc-rio.br