Tipo de Clipping: WEB
Data: 23/03/2017
Veículo: Valor Econômico
As mudanças que a terceirização e o trabalho temporário regulamentados pelo Projeto de Lei (PL) 4.302 promoverão sobre o emprego - e, por consequência, sobre a arrecadação -, na avaliação de especialistas, ainda não estão claras. A flexibilização que ambos os regimes proporcionam, de um lado, podem estimular as contratações legais, elevando a formalização da economia. Exigências que constam no texto, entretanto, e a insegurança que sua tramitação - em paralelo a uma proposta que tratava do mesmo assunto no Senado - gerou em muitas empresas, podem limitar o impacto ou mesmo torná-lo adverso, elevando a rotatividade, por exemplo.
O professor do departamento de economia da PUC-RJ Gabriel Ulyssea avalia que a medida pode fomentar as admissões com carteira assinada no curto prazo, mas, especialmente no caso do trabalho temporário - e na ausência de uma reforma trabalhista -, provocar aumento na taxa de rotatividade, que já é elevada no Brasil.
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O texto votado ontem na Câmara prevê que os contratos de trabalho temporário tenham no máximo seis meses, prorrogáveis por mais três, com um período de "quarentena" - o intervalo exigido para que a mesma empresa volte a convocar o trabalhador que prestou serviço para ela sob esse regime - de três meses.
Para ele, o governo deveria ter concentrado seus esforços na reforma trabalhista, que tramita em comissão especial na Câmara e tem, em sua avaliação, benefício mais amplo para o setor produtivo - a possibilidade de adaptar a jornada de trabalho conforme a necessidade e de contratar funcionários em período parcial. "Se ela fosse aprovada, a terceirização não faria tanto sentido assim para boa parte das empresas", ele diz, já que muitas dessas companhias teriam instrumentos melhores de flexibilização à disposição. A terceirização ficaria mais restrita a setores como o da construção, que precisa de serviços especializados em etapas específicas de cada projeto.
Da forma como está escrito, com particularidades como a exigência de capital social mínimo de R$ 100 mil para que uma empresa seja prestadora de serviço temporário, o PL 4.302 pode criar ainda mais distorções no mercado de trabalho, beneficiando grupos específicos. "É mais um puxadinho brasileiro".
A aprovação do PL, diz Otávio Pinto e Silva, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do setor trabalhista do Siqueira Castro Advogados, não deve gerar uma "corrida à terceirização". Muitas empresas, ele pondera, sentem-se inseguras diante da forma como a terceirização tramitou no Congresso. O PL 4.302, de 1998, foi resgatado pela Câmara no fim de 2016, depois de ampla discussão acerca do PL 4.330, que trata do mesmo assunto e hoje está no Senado. "Quem garante que em seis meses, ou mais para frente, o projeto do Senado não passe e a responsabilidade da contratante, que hoje é subsidiária, passe a solidária?", questiona.
Pesquisador do Ibre-FGV e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), José Roberto Afonso pontua que as novas formas de contratação são inerentes às mudanças nos modos de produção e que a regulamentação, em última instância, tende a ter impacto positivo na formalização. "São fenômenos inevitáveis. A regulamentação dará mais segurança e proteção mínima aos serviços.
Ele acrescenta que a chamada "pejotização", a contratação de funcionários como pessoa jurídica - que recolhem menos impostos do que seus pares empregados sob regime CLT -, não seria disseminada pela nova legislação, como argumentam os que se opõem à medida. Ela já ganhou fôlego com a ampliação do Simples, a taxação sobre lucro presumido e a criação do microempreendedor individual (MEI). "E creio que já conte em nossa economia mais do que a terceirização", ressalta.
Para o economista da Opus Gestão de Recursos José Marcio Camargo, "não é claro" que haverá perda de arrecadação para o governo, como também colocam aqueles contrários à nova legislação. "A flexibilização pode incentivar as contratações formais", pondera ele, que avalia como positiva a aprovação do PL, à medida em que ele diminui a incerteza jurídica sobre os regimes de contratação e que reduz o custo de mão de obra para as empresas.