O cineasta João Moreira Salles e sua mulher Branca Vianna Moreira Salles doaram R$ 350 milhões para o Serrapilheira, o instituto privado de apoio à ciência que acabaram de criar. A título de comparação, o orçamento transferido do Tesouro à Fapesp, a fundação de pesquisa de São Paulo que é referência nacional, foi de R$ 1 bilhão em 2016.

O Serapilheira é provavelmente o primeiro instituto brasileiro privado exclusivamente voltado para o financiamento da pesquisa e da divulgação científica. A ideia é financiar projetos científicos de física, química, matemática, geociências, ciências dos materiais, ciências biológicas e médicas. Não irá atuar em ciências humanas e artes, áreas do Instituto Moreira Salles. "Já há certa cultura de doação no Brasil, mas nada em ciência porque ela não habita a imaginação brasileira", diz João Moreira Salles.

O Serrapilheira, com sede no Rio de Janeiro, é associação civil sem fins lucrativos. Seu orçamento virá do ganho real da aplicação financeira da doação do casal Moreira Salles. A estimativa é de algo em torno a R$ 16 milhões e R$ 18 milhões, a juros de hoje.

O instituto é dirigido pelo geneticista francês Hugo Aguilaniu, da Escola Superior de Lyon. Foi escolhido entre 138 currículos do Brasil e do exterior que se candidataram ao posto. Os projetos serão selecionados pelo conselho científico formado por 12 cientistas brasileiros e estrangeiros como o matemático francês Étienne Ghys e a geneticista do Instituto de Biociências da USP Mayana Zatz.

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Serrapilheira, segundo o dicionário Aurélio, é a "camada de folhas e galhos etc., de mistura com terra, que cobre o solo da mata". O professor Edgar Dutra Zanotto, presidente do conselho científico do instituto, explica que "é o nome que se dá àquela forração que todas as florestas têm." Os estudos indicam que a serrapilheira facilita a proliferação de fungos e bactérias, mantém a umidade da mata "e é essencial para a fertilização da floresta", continua Zanotto.

A intenção do Serrapilheira é transpor esta qualidade e "fertilizar a ciência", disse Zanotto ao Valor. O alvo principal é estimular o trabalho de jovens pesquisadores. A ideia preliminar, que terá que ser aprovada pelo conselho, seria financiar 100 a 150 projetos no primeiro ano, com até R$ 100 mil cada.

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"Entre nós o valor simbólico da ciência é baixo", diz Branca Moreira Salles, presidente do conselho administrativo do instituto, em nota à imprensa. "Na nossa literatura não há personagens cientistas. Todos são escritores, jornalistas, professores, publicitários. Aqui é raro alguém imaginar uma carreira na matemática. Os jovens não são cativados para as carreiras científicas", continua ela.

Ontem, durante entrevista, João Moreira Salles relatou a percepção de que, no Brasil, formar-se cientista não entusiasma os jovens. Segundo a "Folha de S. Paulo", ele citou um ano em que se formaram 30 alunos de cinema na PUC-RJ e só dois matemáticos. "O Brasil será uma tragédia. Uma tragédia bem filmada, mas ainda assim uma tragédia."

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