Tipo de Clipping: Web
Data: 24/04/2017
Veículo: Extra
RIO - Em entrevista ao GLOBO, dois especialistas apresentam pontos diferente acerca da proposta da reforma trabalhista. Reflexão acontece após o relator do texto, Rogério Marinho (PSDB-RN), afirmar que pretende aceitar algumas das emendas que melhorem e tornem mais claro o texto. Apesar disso, Marinho mas já adiantou que não pretende mexer “nem um milímetro” no que diz respeito ao fim da obrigatoriedade da contribuição sindical.
- Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese: proposta “cria ambiente favorável à fragilização estrutural”.
A proposta de reforma trabalhista legaliza práticas de precarização e fragilização adotadas por empresas que não cumprem a CLT, além de criar um ambiente favorável para que elas controlem os direitos dos trabalhadores, afirma Ganz Lúcio.
— Essa reforma tem uma abrangência incalculável. São mais de cem medidas que mudam a CLT e afetam o que é o sindicato, o seu papel, a solução dos conflitos, o direito coletivo e o individual. É uma agenda que busca, com a segurança jurídica, mecanismos estruturais de redução do custo do trabalho e, junto com a terceirização e outras medidas em curso, cria um ambiente favorável à fragilização estrutural das relações do trabalho, apesar do discurso de que haverá ampliação da representação sindical e mais empregos.
Para Ganz Lúcio, a reforma foi desenhada para esvaziar a representação sindical, o que, a seu ver, em um momento de desemprego recorde, cria “um desequilíbrio na relação capital/trabalho”:
— O sentido de fortalecimento da negociação requer que as duas partes estejam fortalecidas e sejam capazes de uma disputa distributiva igual. Mas, quando olhamos, o que temos é um movimento oposto, de enfraquecimento da representação sindical e empoderamento do papel da empresa na relação direta com os trabalhadores.
Ele ainda vê enfraquecimento da Justiça trabalhista:
— A Justiça do Trabalho diluiria apenas aquelas situações em que ocorresse uma escandalosa agressão ao direito, pois não poderá mais emitir suas interpretações sobre aquilo que é vazio. Com a sobreposição do acordado sobre o legislado, a ação na Justiça passa a ter limitadores.
Ganz Lúcio considera difícil saber o que acontecerá:
— Esperava que a Câmara não aprovasse essas mudanças, mas o governo parece ter maioria e se comprometeu com essa reforma dos sonhos do setor empresarial.
- José Márcio Camargo, professor de economia da PUC-Rio e sócio da consultoria Opus: ‘fim do imposto acabará com sindicatos pelegos’
O economista José Márcio Camargo considera a permissão para que o acordado prevaleça sobre o legislado, ou seja, o que ficar acertado entre trabalhadores e sindicatos se sobreponha à legislação, o grande acerto da proposta de reforma. Na sua opinião, a Justiça do Trabalho brasileira é "esquizofrênica".
— Felizmente ela (a Justiça do Trabalho) vai sair enfraquecida dessa reforma pois, hoje, quem define quanto custa um trabalhador para uma empresa é ela. Se eu sou demitido e vou à Justiça questionar, ela avalia o meu pedido e só depois da sentença final a empresa sabe quanto custou aquele trabalhador. Isso vai diminuir a incerteza jurídica para o empresário, facilitando a geração de emprego no futuro — argumenta o economista, lembrando que, quando uma empresa brasileira entra em recuperação judicial, o maior passivo é sempre o trabalhista.
Ele ressalta também que o fim da obrigatoriedade de pagamento do imposto sindical deve promover uma seleção natural dessas entidades:
— O fim do imposto sindical vai acabar com os sindicatos pelegos, pois os que não conseguem defender seus trabalhadores vão deixar de existir, com a categoria que não se sente representada deixando de contribuir. Só vão sobreviver os sindicatos que lutarem por seus trabalhadores.
Ele também defende a criação da demissão em comum acordo, previsto no parecer do relator da proposta de reforma. Segundo a proposta, o trabalhador não teria mais a obrigação de homologar a demissão no sindicato. Se quiser, empregador e empregado podem negociar a rescisão e levar pra ser homologada na Justiça. Ao ser questionado a respeito de o trabalhador ser a parte mais fraca nessa negociação, correndo o risco de ficar em desvantagem, ele sugere que sempre esteja acompanhado de um advogado trabalhista nessas tratativas.