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Data: Quinta-feira, 25 de abril de 2013
Boston: um lugar de proporções globais
15/04/2013
Ao saber da notícia, a pergunta que me vem é: “Outra vez?” “De novo?“. Realmente, é uma sensação horrível de “déjà vu”, de repetição banal e enfadonha o fato de que uma vez mais armas de fogo, explosivos ou qualquer outro artefato e material mortífero detonaram várias vidas inocentes em um lugar aparentemente seguro e feito para o esporte e a diversão.
Agora foi no meio de uma maratona, competição esportiva para a qual jovens, adultos e até idosos se preparam durante meses e que é assistida por centenas de pessoas. Quantas vezes já não acompanhei marido, filhos, amigos em maratonas ou meias maratonas, ou triatlo, ou outras quaisquer competições esportivas? É belo ver aquelas roupas coloridas, o esforço dos atletas, a alegria na reta final, os abraços, os risos. Custa imaginar que em meio a este cenário de vida de repente ocorram explosões e voem estilhaços. Pessoas percam a vida, outras tenham membros amputados, a saúde permanentemente abalada, e vejam esfumar-se para sempre a tranquilidade e a alegria de viver.
Desta vez foi na chegada da Maratona de Boston. Outro dia foi numa escola primária. E antes em um cinema, em dia de estreia. E antes ainda em um shopping. E numa universidade, numa lanchonete, em uma colônia de férias. Em suma, nos lugares mais improváveis e não compatíveis com violência e morte, estas sombrias e indesejadas presenças teimaram em fazer-se visíveis, matando e destruindo. Não se pode mais dizer que é aqui ou ali.
O tradicional preconceito que localizava a violência e o medo em lugares mais pobres e periféricos está cabalmente desmentido. O lugar do terror e do medo agora é qualquer lugar, em qualquer latitude, a qualquer hora e em qualquer circunstância. Nem o lazer está a salvo. Nem o esporte. Qualquer lugar é lugar e qualquer hora é hora para que exploda repentinamente a morte, vinda não se sabe de onde, com sua pérfida e traiçoeira imprevisibilidade.
Agora estamos na etapa de caçar os culpados e usar de todos os meios para deles obter informações que levem a alguma rede terrorista internacional, de preferência islâmica. Os dois irmãos chechenos passaram a ocupar o foco do noticiário internacional. A morte do primeiro faz com que só reste um, que no momento se encontra impossibilitado de comunicar-se. Até agora, as informações obtidas mostravam os dois irmãos como pessoas normais e pacíficas. O falecido era casado e tinha uma filha de três anos, da qual se ocupava desveladamente, enquanto a mulher ia trabalhar. O mais jovem é descrito pelo pai como “um anjinho”.
Estudante aplicado, de hábitos tranquilos, nada levava a crer que juntamente com o irmão poderia explodir bombas confeccionadas artesanalmente em meio a um evento público, matando a torto e a direito crianças, jovens e adultos para eles desconhecidos. Talvez se descubra algo durante os interrogatórios a que está sendo submetido o jovem suspeito no hospital onde está internado sob vigilância que reduza a tensão da opinião pública por algum tempo. Ele será preso, condenado à prisão perpétua ou talvez até mesmo à pena capital. Todos respirarão aliviados...até que...daqui a algum tempo, em um parque de diversões, ou em uma lanchonete ou em algum evento de grandes proporções, aconteça de novo. A violência entrará anônima e destruidora, não deixando pedra sobre pedra. E a perplexidade tomará conta de todos. E mais uma vez ninguém entenderá. O que mais aterroriza é que não parece haver para onde fugir.
Não acontece só aqui ou lá; ou nesta circunstância e não naquela. Boston é um lugar de dimensões globais. Assim como o foi Nova York, ou a Dinamarca, ou o trem de Londres e de Madri. Ou, entre nós, o colégio de Realengo. Onde acontecerá da próxima vez? Não se sabe nem se imagina, mas se teme.
Solução prática e eficiente não há. É como tratar de apanhar entre as mãos um tufão impetuoso que arrasta casas e plantações. Ou como tentar segurar entre os dedos uma enguia que escorrega e escapa. Em todo caso, o que parece claro é que o revide, a revanche, a violência que contra-ataca a violência não estão resolvendo muita coisa. Qual cogumelo que se autorreproduz, ela cresce e alcança mais longe e mais cruelmente. Talvez a única coisa a fazer seria trabalhar pedagogicamente as novas gerações, para que tomem consciência do planeta que lhes estamos legando: um espaço muito difícil de viver. Quem sabe não se consegue despertar nelas um desejo ardente de fazer com que seja diferente? Quem sabe os meninos e meninas de hoje, adultos de amanhã, não poderão desejar e empregar o melhor de suas forças para construir um mundo diferente daquele que Tamerlan e Dzokhar Tzarnaev quiseram explodir com suas bombas? Enquanto este processo não começar a ser construído, viver se tornará cada vez mais perigoso...e mortalmente improvável.
*Maria Clara Lucchetti Bingemer, professora do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, é autora de vários livros como 'Um rosto para Deus' (Ed. Paulus) e 'Crônicas de cá e de lá' (Ed. Subiaco), que pode ser encomendado diretamente à escritora pelo e-mail – agape@puc-rio.br - R$ 20,00.

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