Corpo masculino no estilo “pai de família” (chamado nas redes sociais de “dad bod”) é celebrado — mas o mesmo não acontece em relação às mulheres

Há quem prefira homens que cuidam milimetricamente do corpo e que não passam um dia sem puxar ferro na academia. Mas, ao que tudo indica, esta não é preferência número um das mulheres. Um artigo de uma universitária norte-americana viralizou, ao listar motivos para preferir homens com o dad bod, ou “corpo de pai de família”. 

De acordo com a estudante, a forma física caracteriza um homem que “vai à academia de vez em quando, mas bebe muito no fim de semana e adora comer oito fatias de pizza de uma vez”. Ou seja, um cara desencanado, que gosta de se divertir. Essa preferência pode não ser nova, mas ganhou popularidade com a publicação de fotos de famosos que vão do curitibano Alexandre Nero a Leonardo DiCaprio: se eles podem ter barriguinha, nossos namorados também, certo? 

Entenda mais sobre a celebração dos “homens reais”: 

Homem pode 

Joana de Vilhena Novaes, psicanalista e coordenadora do Núcleo de Estudos de Doenças da Beleza da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), explica que os critérios que usamos para identificar a beleza do homem são diferentes dos utilizados para as mulheres. “Nós somos mais condescendentes com a feiura do sexo oposto do que a sociedade é conosco. O homem não é medido socialmente pela imagem, existem outros fatores que não incluem a barriga ou a ruga. A leitura feita para saber se um homem é bem-sucedido é a virilidade, o dinheiro e o poder. Já a mulher feia é ‘menos mulher’”.

Exemplo disso, segundo a profissional, é o interesse na dieta ou no guarda-roupa da presidente, mesmo em meio a tantos escândalos políticos. “A estética não está no imaginário social quando vai se criticar um homem. Para a sociedade, a aparência da mulher é um cartão de visitas e equivale a seu caráter”, comenta. De acordo com a autora do livro O Insustentável Peso da Feiura, mulheres acima do peso chegam a ser preteridas em processos seletivos porque, injustamente, o mercado considera que elas não sabem gerenciar o tempo ou são lentas. 

A psicóloga Maria Marta Ferreira, autora do livro Psicologia do Emagrecimento, concorda que a sociedade é mais exigente com a mulher: “Faz tempo que homens de barriguinha têm seu charme e mulher com quilinhos extras são considerados descuidadas. Um impregnado e difícil problema cultural que ainda carrega seu ranço”, aponta. 

E o “mom bod”? 

Por esses motivos, a onda de glamurização do porte físico menos atlético nunca celebrou o corpo da mãe. Para Maria Marta, sofremos com o “vírus do idealismo”, que impõe ícones de beleza femininos com barrigas chapadas dois meses após o parto. “Essas exceções inspiram muitas mulheres, mas constrangem e imobilizam tantas outras, que não têm a mesma genética, a mesma realidade, passando uma falsa realidade de que todas podem e devem ser assim.” Para Joana, a cobrança não para por aí: “Exibir uma silhueta enxuta não basta, ela ainda precisa ser uma ótima dona de casa e mãe e ter uma vida sexual incrível”. 

Revisão da ditadura da magreza 

O dad bod também pode ter surgido porque estamos questionando mais os padrões de beleza, de acordo com Maria Marta. Se por um lado existem pessoas com sobrepeso esmagadas por olhares de recriminação e julgamentos de descuido, há outras aparentemente saudáveis, mas que possuem transtornos alimentares (tudo camuflado por certo estilo de vida). “Tomara que essa ‘tendência’ seja o reflexo de uma dose de bom senso, redução dos extremismos e adequação à humanidade das pessoas, preocupadas apenas em se manter magras, saudáveis, mas não escravizadas por rígidos hábitos alimentares e rotinas de exercícios”, comenta. 

Pessoas comuns também são bonitas 

Para Maria Marta, nesses tempos em que qualquer notícia ganha proporções mundiais em um piscar de olhos, algumas tendências que bombam na internet acabam nos lembrando do óbvio: “A grande maioria se relaciona com as pessoas por outros aspectos que não apenas a estética. Pessoas comuns também são bonitas. Ponto”.