O Globo

Tipo de Clipping: WEB

Data: 31/07/2015

Veículo: O Globo

Editor de nomes conservadores, Carlos Andreazza se firma como voz dissonante do mercado de livros
31/07/2015

RIO - Na infância, Carlos Andreazza bebericava o uísque do avô Mário, ministro dos Transportes de três governos da ditadura militar. Na adolescência, era titular no meio de campo do time de futebol do Jockey Club Brasileiro e discutia com professores que o perseguiam por conta do sobrenome “maldito”. Mais velho, quando cursou Jornalismo na PUC-Rio, fundou um site para discutir cultura e política. Aos 35, o editor de não ficção e literatura brasileira da Record é uma das vozes mais dissonantes do mercado editorial: brigou com a Festa Literária Internacional de Paraty, execrou publicamente os livros de colorir e dá de ombros para quem o critica e o chama de “editor dos liberais e conservadores”.

No último dia 20, Andreazza concretizou o que considera seu maior êxito: assinou, enfim, contrato com Paulo Cesar de Araújo, autor da polêmica (e censurada) biografia “Roberto Carlos em detalhes”. Ao tirar o historiador e biógrafo da Companhia das Letras, assegurou a publicação de seu novo — e aguardadíssimo — livro sobre o Rei.

— Fizemos uma oferta financeira boa e demos garantias ao Paulo Cesar. Antes mesmo da votação do Supremo Tribunal Federal (que, em junho, derrubou a necessidade de autorização prévia dos biografados), garantimos que publicaríamos a obra independentemente da decisão — conta o editor.

Araújo diz, usando oportuno trocadilho, que o acerto com a editora foi feito por questão de detalhes. Nos bastidores, porém, especula-se que as garantias de segurança dadas pela Record pesaram a favor de Andreazza. A editora, mesmo no período em que biografias não autorizadas eram frequentemente vetadas pela Justiça, publicou títulos como “Dirceu”, de Otávio Cabral, e “Tudo ou nada: Eike Batista e a verdadeira história do Grupo X”, de Malu Gaspar. 

Os dois livros refletem os rumos dados por Andreazza à editora fundada em 1942 por Alfredo Machado e Décio Abreu. O investimento em livros-reportagem e obras críticas ao governo federal se tornou uma marca do carioca que chegou à Record em 2012. Quando Luciana Villas-Boas deixou o cargo de diretora editorial da empresa, Sérgio Machado, presidente do Grupo Record, decidiu descentralizar a tomada de decisões no carro-chefe do conglomerado, que reúne outras 11 editoras, como a José Olympio e a Bertrand Brasil. Dividiu setores e trouxe Andreazza para cuidar de não ficção. Com a saída de Guiomar de Grammont, em 2013, ele assumiu também a literatura brasileira.

Machado conheceu Andreazza por intermédio da irmã, Sônia. Impressionou-se com o rapaz que havia construído sua carreira nas pequenas editoras Contracapa, Capivara e La Table Ronde, de Paris. Três anos depois da escolha, ele diz que o editor “superou expectativas”, e que já é possível enxergar suas digitais na Record.

— Dá para identificar uma certa guinada para a direita — confessa, aos risos. — A teoria que a Luciana defendia era que a esquerda lê mais do que a direita. E, para mim, isso sempre fez um certo sentido. O Andreazza apostou no contrário e, para nossa surpresa, deu certo. Ficou provado que a direita também lê. Ele percebeu um crescimento do pensamento liberal. Essa diversidade é boa para a democracia.

O editor reuniu os articuladores do pensamento liberal na Record. Nomes da nova direita, como Rodrigo Constantino, e antigos pontífices do conservadorismo, como Olavo de Carvalho, entraram para o catálogo e, de imediato, deram resultado.

Segundo o site “Publishnews”, em 2014, três dos dez livros mais vendidos pela editora seguiam nessa linha: “O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”, de Olavo de Carvalho; “A década perdida”, de Marco Antonio Villa; e “Não é a mamãe”, de Guilherme Fiuza.

O jovem Kim Kataguiri, líder de movimentos de contestação à presidente Dilma Rousseff, também já assinou contrato e deve publicar até novembro. Andreazza usa o livro lançado em 2013 por Carvalho como exemplo. Nas contas da editora, a obra vendeu mais de 120 mil exemplares.

— O caso do Olavo é muito simbólico. O que fizemos foi dar um tratamento pop ao autor. Nós hypamos o Olavo, desde a escolha do título até a capa — teoriza, chamando o projeto editorial de “primoroso”. — Havia uma demanda reprimida por esses autores, que nós identificamos.

SEM CONCESSÕES AO AVÔ

“Ninguém se chama Andreazza por acaso”. A frase de Nelson Rodrigues serviu como epígrafe do blog que ele manteve até 2011. O avô, de quem herdou os olhos verdes, morreu quando o neto tinha 8 anos. Ele guarda memórias cândidas do responsável por projetos faraônicos da ditadura militar, como a Ponte Rio-Niterói e a Transamazônica.

— Ele era muito carinhoso e me dava uísque, que é um elemento fundamental da minha formação (risos). Eu era fascinado por sua figura. Mas, aos 8 anos, o Andreazza era o meu avô. Para mim, não era o ministro poderosíssimo. Isso aprendi depois. Eu nutria uma admiração enorme por ele — diz o neto, que pretende publicar um livro sobre o legado do avô. — Não vou fazer concessões. Ele foi um signatário do AI-5. E isso me incomoda muito.

Ter o nome ligado à ditadura durante a redemocratização não era exatamente fácil. No colégio, Andreazza precisou lidar com os olhares enviesados de alguns professores.

— Ouvia muita provocação, sofri muito — diz ele, que jura não guardar mágoa dos mestres. — Tive professor torturado. Não posso mensurar uma dor dessas.

Enquanto muitos colegas no mercado editorial são reservados, Andreazza vai para a linha de frente na hora de divulgar os livros. É extremamente ativo nas redes sociais, onde elogia — com adjetivos derramados — os autores que contratou.

— Ele tem um estilo diferente do perfil blasé tradicional dos editores. É passional, engaja-se pessoalmente em todo o processo do livro — diz o amigo Marcelo Moutinho, que publicou “Na dobra do dia” pela concorrente Rocco.

A relação com a internet é antiga. Ao lado de Felipe Moura Brasil, mantinha o site “Tribuneiros”. Os dois dividiam o meio-campo do time do Jockey na adolescência. A parceria saiu dos campos, passou pelo “Tribuneiros” e chegou à Record. Brasil, hoje blogueiro da revista “Veja”, organizou os textos de Carvalho e deve publicar dois livros pela editora em 2016.

Depois que Andreazza assumiu o cargo na Record, seus choques foram muitos. No mais recente, abriu guerra contra os livros de colorir, fenômeno editorial que ajuda as contas de um setor em crise. Mesmo que Rafaella Machado, filha de Sérgio e neta de Alfredo, tenha editado obras do gênero pela Best-Seller, do Grupo Record, ele lançou sua “Campanha pela Maioridade Intelectual”. Acha que a onda não contribui com a leitura:

— Isso não pode ser considerado livro. E não deve estar em lista de best-sellers.

A mais ruidosa das brigas, porém, foi com a Flip. Pelo Facebook, no ano passado, Andreazza criticou a curadoria do jornalista Paulo Werneck, reclamando da pouca presença de autores brasileiros na programação da Festa. Um ano depois, mantém o que disse:

— Eles estão chamando cada vez menos autores da Record. É difícil pensar que isso não é uma atitude política de retaliação. Mas não dá para saber. A Flip é muito fechada, arrogante.

Werneck nega boicote. O curador afirma que convidou nomes como Patrick Modiano, Umberto Eco e John Le Carré, todos autores da Record, e que nunca obteve resposta.

— A verdade é que ele critica a Flip com o argumento da literatura brasileira para criar uma cortina de fumaça. Ele tem dificuldade em trazer os autores internacionais da Record.

Andreazza argumenta que esses autores não costumam viajar, alguns por conta da idade avançada. E diz que trouxe David Carr, convidado pela Festa no ano passado, por ideia do curador.

“CRÉU" NO IMPÉRIO SERRANO, NÃO

A “fama de mau” do editor vai além do mercado. Ele divide com Moutinho e Brasil a paixão pelo carnaval, mais precisamente pelo Império Serrano. E foi na quadra da agremiação, durante a comemoração pelo título do grupo de acesso em 2008, que acabou desafiando um “barra-pesada” da Serrinha.

— Um camarada subiu no palco para cantar a música do “Créu” e a bateria teve que tocar junto. Na mesma hora, o Andreazza desplugou o microfone do sujeito da tomada — conta Moutinho.

O editor ri do episódio, que não rendeu maiores consequências. Mas, agora que é pai da recém-nascida Manuela, diz que jamais o repetiria. Seria o início da fase “Andreazzinha paz e amor”?

— É impressionante como o nascimento de um filho muda as pessoas. A importância que eu dou às coisas hoje é outra.


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